A ABPI – Associação Brasileira da Propriedade Intelectual é uma entidade sem fins lucrativos, fundada em 1963, e que possui, entre os seus objetivos estatutários, a melhoria do ambiente de proteção à propriedade intelectual em nosso país.
Entre as principais preocupações da ABPI, encontra-se a insuficiente dotação orçamentária do INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que, há décadas, não recebe do Governo Federal os recursos minimamente adequados para desempenhar suas relevantes atividades de exame e concessão de direitos de patentes e marcas, uma atividade basilar no esforço de inovação nacional. Prova disso é o excessivo prazo para análise de pedidos de patente, que excede em muito o tempo minimamente aceitável.
Em 2021, o cenário assumiu novas cores com a declaração de inconstitucionalidade, pelo Supremo Tribunal Federal – STF, do parágrafo único do art. 40 da Lei de Propriedade Intelectual (ADI 5529). A regra em questão ofertava um amparo mínimo ao depositante da patente diante da notória mora administrativa do INPI.
Nesse contexto, institucionalizou-se um estado de desconformidade, que foi reconhecido, inclusive, no julgamento da mencionada ADI 5529, de relatoria do Ministro Dias Toffoli. Na origem dessa desconformidade encontra-se o remanejamento, em favor do Tesouro Nacional, da receita proveniente da execução dos serviços do INPI, que não é destinada para a autarquia.
Tal fato chama atenção, já que a importância arrecadada pelas atividades do INPI não é taxa ou tributo, mas simples preço pago pelo usuário do serviço, conforme decidido unanimemente pelo Plenário do STF em 2018, na ADI 3.863. A compreensão traz a reboque algumas indagações: se a cobrança não possui natureza tributária, o que autorizaria a União Federal a não repassar ao INPI os valores por ele obtidos? Haveria alguma justificativa tolerável para que um preço cobrado pelo INPI não fosse a ele revertido, mas sim destinado a finalidades diversas?
Diante desse cenário de precariedade orçamentária, que limita e condiciona negativamente a atuação do INPI, no final de 2021, a Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (ABPI) ingressou na Justiça Federal do Rio de Janeiro com uma Ação Civil Pública de caráter estruturante (proc. nº 5095710-55.2021.4.02.5101/RJ), buscando trazer o INPI para o estado de conformidade. Com esta ação, a ABPI atua de forma cooperativa com as autoridades públicas, em prol de melhores condições para o desenvolvimento tecnológico nacional. Em linhas gerais, busca-se a criação de um plano de metas e providências, a serem cumpridas de forma escalonada. A ABPI é representada na causa pelo advogados Gustavo Osna e Marcelo Mazzola, dois especialistas na matéria.
Em sua defesa, a União Federal alegou, de forma genérica, que a tentativa de ampliar os limites para gastos do INPI até o valor de sua arrecadação esbarraria na Lei de Responsabilidade Fiscal. Já o INPI argumentou inicialmente que o atual financiamento da autarquia seria suficiente (e que eventual mora decorreria da própria complexidade inerente à matéria e aos seus ritos procedimentais). Porém, na sequência, inclusive por força dos recentes cortes orçamentários impostos pela União Federal, os próprios representantes do INPI reconheceram nos autos que:
“(…) os valores arrecadados pela autarquia federal somaram, em 2021, R$ 432,2 milhões de reais a título de receita pela prestação de serviços e R$ 82,4 milhões de reais a título de receita patrimonial, que foram para a conta única do Tesouro Nacional. Desses valores, foram destinados ao INPI, em 2021, cerca de R$ 67,2 milhões de reais para despesas discricionárias, o que correspondeu a pouco mais de 10% dos valores que o INPI arrecadou no mesmo ano, aparentando uma desproporcionalidade entre os valores arrecadados e os que foram revertidos para a autarquia”.
No dia 12.04.2022, o Juízo da 31ª Vara Federal do Rio de Janeiro, após sopesar todos os interesses em jogo, julgou procedentes os pedidos autorais, para:
(i) CONDENAR o INPI a:
- apresentar, no prazo de 90 (noventa) dias, relatório diagnóstico atualizado e detalhado do funcionamento da autarquia, identificando pontos de inefetividade e de ineficiência, a partir de parâmetros técnicos e comparados, bem como as necessidades materiais, orçamentárias e funcionais para aprimoramento de suas atividades;
- apresentar, no mesmo prazo de 90 (noventa) dias, exposição das medidas a serem progressivamente adotadas para aprimoramento de suas atividades e um planejamento detalhado para sua adoção, bem como sua respectiva previsão orçamentária. O planejamento deverá abranger os anos de 2022, 2023 e 2024, e ser específico quanto às ações a serem realizadas, os meios de execução, os prazos e as fontes de custeio e será objeto de análise e homologação na fase de cumprimento de sentença, na forma da fundamentação; e
- implementar o plano de reestruturação a que se refere o item “b”, após homologação neste processo, devendo apresentar relatórios demonstrativos da adoção das medidas realizadas de modo periódico ao Juízo, permitindo-se a aferição de sua suficiência e adequação;
e (ii) CONDENAR a UNIÃO FEDERAL a destinar ao INPI das receitas necessárias para a efetivação do plano referido no item “b”, efetuando seu repasse em atenção ao respectivo cronograma homologado na fase de cumprimento de sentença.
Diante da urgência do assunto e objetivando dar início à fase de execução provisória do julgado, a juíza deferiu a antecipação da tutela na própria sentença, determinando a intimação do INPI para o cumprimento dos itens “a” e “b”, nos prazos ali estabelecidos. Cabe recurso.
A ABPI continuará cumprindo seu objetivo estatutário de contribuir para o contínuo aperfeiçoamento do sistema brasileiro de proteção à propriedade intelectual, única forma de estimular a inovação indispensável ao desenvolvimento social e econômico de nosso país.
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