Newsletter - Edição 36 - Maio 2022

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Patentes e desenvolvimento econômico num só diapasão

Em 2021, segundo o INPI, dos 26.921 pedidos de patente no Brasil, apenas 19% foram de residentes, o que faz com que os países estrangeiros, com liderança dos Estados Unidos, dominem os registros de patentes no País. Para o presidente da ABPI, Gabriel Leonardos, o problema não é apenas o baixo patenteamento entre os residentes, mas o fraco desempenho do Brasil entre os depositantes mundiais de patentes, sejam nacionais ou estrangeiros. A mudança deste cenário, aponta, depende de maior abertura econômica, fomento ao mercado interno e inserção do Brasil nas cadeias produtivas globais.

ABPI News: O desinteresse das empresas brasileiras no sistema de patentes deve-se apenas ao fato de que desconhecem os benefícios do sistema de PI?

Gabriel Leonardos: Esta certamente é uma das razões, mas não é a principal. Essa proporção de aproximadamente 80%/20% entre depósitos de não residentes e residentes, aqui no Brasil, tem sido constante nos últimos 30 anos. O problema não é este baixo percentual entre os residentes, mas a queda progressiva dos pedidos de patentes no Brasil, sejam residentes ou não residentes, o que indica a defasagem tecnológica do país. É importante salientar que não é estranho que um país receba mais depósitos de patentes de não residentes, do que de residentes; afinal, há 193 países-membros na OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual), e é compreensível que a soma de depósitos provenientes de todos os outros países seja superior que a soma dos depósitos de brasileiros. Isso ocorre também nos EUA, por exemplo, onde os estrangeiros respondem por 55% dos depósitos totais. São raros os países, como a Alemanha, em que a maioria dos depósitos (68%) são de nacionais (todos os dados são de 2020, segundo a OMPI). Quanto mais aberta for a economia de um país, quanto maior for o mercado interno, e quanto mais esse país estiver inserido nas cadeias produtivas globais, maior será o interesse dos estrangeiros em proteger suas patentes naquele território. 

ABPI News: A mesma causa explica a liderança das universidades e Petrobras (e não das empresas privadas) nos pedidos de patente entre os residentes?

GL: A virtual inexistência de empresas privadas nacionais entre os principais depositantes de patentes no Brasil é uma demonstração de que as políticas atuais estão erradas, ou, no mínimo, são insuficientes. A Lei de Inovação (Lei nº 10.973, de 02.12.2004, modificada posteriormente pela Lei nº 13.243, de 11.01.2016) estimulou o interesse das universidades públicas brasileiras em depositar patentes. As patentes contribuem para a disseminação de informações tecnológicas (pois são acessíveis através de diversas bases de dados públicas) e têm o potencial de gerar receitas de royalties para as universidades. Entretanto, não se pode deixar de mencionar que nas economias mais desenvolvidas os maiores depositantes são as empresas privadas, pois são elas que têm o interesse econômico imediato na exclusividade de mercado assegurada pela patente. Note-se que não propugnamos a redução do número de patentes depositadas por entidades públicas de pesquisa (número este que, quando comparado ao de outros países, nem é tão alto), mas sim o aumento substancial das patentes a serem requeridas por empresas privadas nacionais. A conclusão é que, lamentavelmente, a Lei de Inovação, com todas as suas qualidades, é largamente insuficiente para as necessidades do nosso país.

ABPI News: Por que o baixo volume de residentes no sistema de PI não se dá em relação ao registro de marcas, que cresceram durante a pandemia?

 GL: O brasileiro é criativo e adora novidades. O relançamento de produtos antigos, ou de novos produtos, ainda que sem grande avanço tecnológico, é constante e demanda sempre novas marcas. Mas novas marcas, por mais que aumentem a atratividade comercial de produtos, não significam, necessariamente, que novas tecnologias estejam sendo incorporadas e disponibilizadas aos consumidores nacionais.

ABPI News: Pode-se associar diretamente o baixo volume de pedidos de patentes pelos residentes ao desenvolvimento econômico brasileiro?

GL: Como explicou a economista Zeina Latif, em recente palestra promovida pela ABPI, o Brasil está, há décadas, preso na armadilha da renda média, da qual é difícil escapar. Sem estímulos fortes à inovação – e combate à indústria da cópia – não venceremos esse desafio. Nos EUA há mais de 20 vezes o número anual total de patentes do que entre nós (naquele país houve 597.172 depósitos em 2020!), e essa deveria ser uma imensa preocupação para as nossas autoridades: o progressivo distanciamento tecnológico do Brasil em relação aos países mais avançados. Temos poucas patentes de nacionais e os estrangeiros também perderam o interesse em nós. Cultivamos, em nosso país, a soja que alimenta os porquinhos que são servidos no almoço aos cientistas chineses que desenvolvem a tecnologia 6G e a inteligência artificial. Precisamos estimular o agronegócio, é claro, pois é uma grande riqueza nacional, na qual temos indiscutíveis vantagens comparativas em relação a quase todos os países do mundo, mas apenas com a inovação industrial é que conseguiremos criar uma sociedade sofisticada, que agregue valor aos bens e serviços aqui produzidos.

ABPI News: O Comitê Empresarial da ABPI está dentro deste espírito de mostrar os benefícios do sistema de PI para o setor privado? 

GL: Sim, nosso Comitê Empresarial está trabalhando com uma preocupação muito intensa no sentido de alertar as autoridades para a necessidade de estimular a inovação dentro das empresas estabelecidas em nosso país.

ABPI News: Qual a expectativa em relação ao GIPI (Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual).  É uma luz no fim do túnel da baixa inovação brasileira?

GL: O GIPI está aberto à sociedade e trabalhando intensamente para melhorar o ambiente legal e regulatório brasileiro. Esperamos que haja continuidade nesses esforços, e que a política de propriedade intelectual se torne uma política de Estado, e não vinculada a este ou aquele governo. Nada conseguiremos se não tivermos continuidade e perseguição a uma estratégia uniforme ao longo de décadas. A ENPI – Estratégia Nacional de Propriedade Intelectual, e a ENI – Estratégia Nacional de Inovação, desenvolvidas e divulgadas nos últimos anos, são passos muito importantes nesse sentido.

 

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